sexta-feira, 9 de agosto de 2019

Os anti-judaísmo dizem que os judeus controlam o mundo, os judeus radicais dizem que o judaísmo é a melhor e mais importante religião do mundo, mas ambos estão errados.*

*046. Os anti-judaísmo dizem que os judeus controlam o mundo, os judeus radicais dizem que o judaísmo é a melhor e mais importante religião do mundo, mas ambos estão errados.*

```É somente nos séculos XIX e XX que vemos os judeus dando uma contribuição extraordinária à humanidade como um todo, com sua descomunal participação na ciência moderna. Além de nomes tão conhecidos como os de Einstein e Freud, cerca de 20% de todos os laureados com o prêmio Nobel na ciência são judeus, embora os judeus constituam menos de 0,2% da população mundial. Mas deve-se ressaltar que essa foi uma contribuição de judeus individuais, e não do judaísmo como religião ou cultura. A maioria dos cientistas importantes judeus nos últimos duzentos anos atuou fora da esfera religiosa judaica. Na verdade, judeus começaram a dar sua notável contribuição à ciência somente após terem abandonado as yeshivás em favor de laboratórios.```

```Antes de 1800, o impacto judaico na ciência era limitado. Muito naturalmente, os judeus não desempenharam um papel significativo no progresso da ciência na China, na Índia ou na civilização maia. Na Europa e no Oriente Médio alguns pensadores judeus, como Maimônides, tiveram considerável influência sobre seus colegas gentios, mas no geral o impacto judaico foi mais ou menos proporcional a seu peso demográfico. Durante os séculos XVI, XVII e XVIII o judaísmo quase não contribuiu para a irrupção da Revolução Científica. Com exceção de Espinosa (cujas provocações fizeram com que fosse excomungado da comunidade judaica), é difícil mencionar um único judeu que tenha sido crucial para o nascimento da física, química, biologia ou ciências sociais modernas. Não sabemos o que os antepassados de Einstein estavam fazendo na época de Galileu e de Newton, mas provavelmente estavam muito mais interessados em estudar o Talmude do que estudar a luz.```

```A grande mudança só veio ocorrer nos séculos XIX e XX, quando a secularização e o Iluminismo Judaico levaram muitos judeus a adotar a visão de mundo e o estilo de vida de seus vizinhos gentios. Os judeus começaram então a se juntar a universidades e centros de pesquisa de países como a Alemanha, a França e os Estados Unidos. Eruditos judeus trouxeram dos guetos e dos sthtetls, aldeias com grande população judaica, importantes legados culturais. O valor central da educação na cultura judaica foi um dos principais motivos para o extraordinário sucesso dos cientistas judeus. Outros fatores incluem o desejo de uma minoria perseguida de mostrar seu valor, e as barreiras que impediam judeus talentosos de progredir em instituições mais antissemitas como o Exército e a administração do Estado.```

```Mas, enquanto os cientistas judeus traziam com eles das yeshivás uma rigorosa disciplina e uma fé profunda no valor do conhecimento, não traziam nenhuma bagagem útil de ideias e insights concretos. Einstein era judeu, mas a teoria da relatividade não era “física judaica”. O que a fé na sacralidade da Torá tem a ver com a noção de que energia é igual a massa multiplicada pela velocidade da luz ao quadrado? Para servir de comparação, Darwin era cristão, e até começou seus estudos em Cambridge com a intenção de tornar-se um sacerdote anglicano. Isso implicaria que a teoria da evolução é uma teoria cristã? Seria ridículo listar a teoria da relatividade como uma contribuição judaica à humanidade, assim como seria ridículo creditar ao cristianismo a teoria da evolução.```

```Da mesma forma, é difícil ver qualquer coisa particularmente judaica na invenção do processo de sintetizar amônia, de Fritz Haber (prêmio Nobel de química em 1918); na descoberta do antibiótico estreptomicina, por Selman Waksman (prêmio Nobel de fisiologia ou medicina, em 1952); ou na descoberta dos quase-cristais por Dan Schechtman (prêmio Nobel de química, em 2011). No caso de estudiosos das áreas de humanidades e ciências sociais — como Freud —, sua herança judaica teve provavelmente um impacto mais profundo em seus insights. Porém mesmo nesses casos as descontinuidades são mais flagrantes do que as conexões que sobrevivem. As visões de Freud sobre a psique humana foram muito diferentes das do rabi José Caro ou do rabi Iochanan ben Zakai, e ele não descobriu o complexo de Édipo consultando cuidadosamente o Shulchan Aruch (o código prático da lei judaica).```

```Para resumir, embora a ênfase judaica no estudo provavelmente tenha dado uma importante contribuição ao sucesso excepcional dos cientistas judeus, foram pensadores gentios que proveram os fundamentos para as realizações de Einstein, Haber e Freud. A Revolução Científica não foi um projeto judaico, e os judeus só encontraram seu lugar quando foram das yeshivás para as universidades. Na verdade, o hábito judaico de buscar respostas a todas as questões lendo textos antigos constituiu um obstáculo significativo para a integração judaica no mundo da ciência moderna, onde as respostas vêm de observações e experimentos. Se existe alguma coisa, no que tange à religião judaica em si mesma, que necessariamente leve a inovações científicas, como é que entre 1905 e 1933 dez judeus seculares alemães receberam o prêmio Nobel de química, medicina e física, mas durante o mesmo período nem um só judeu ultraortodoxo, ou um só judeu búlgaro ou iemenita recebeu qualquer prêmio Nobel?```

```Para não criar suspeitas de que sou um “judeu que odeia judeus”, ou um antissemita, quero enfatizar que não estou afirmando que o judaísmo foi uma religião especialmente má ou obscurantista. Tudo o que estou dizendo é que não foi importante para a história da humanidade. Durante muitos séculos o judaísmo foi a humilde religião de uma pequena minoria perseguida que preferia ler e contemplar a conquistar países distantes e queimar hereges na estaca.```

```Os antissemitas comumente pensam que os judeus são muito importantes. Antissemitas imaginam que os judeus controlam o mundo, ou o sistema bancário, ou pelo menos a mídia, e que deve-se culpá-los de tudo, desde o aquecimento global até os ataques do Onze de Setembro. Essa paranoia antissemita é tão ridícula quanto a megalomania judaica. Os judeus podem ser um povo muito interessante, mas, quando se olha para o quadro como um todo, tem-se de constatar que eles têm tido um impacto muito limitado no mundo.```

```Ao longo da história, os humanos criaram centenas de religiões e seitas diferentes. Um punhado delas — cristianismo, islamismo, hinduísmo, confucionismo e budismo — influenciou bilhões de pessoas (nem sempre para o bem). A grande maioria dos credos — como a religião bon, a religião iorubá e a religião judaica — teve impacto muito menor. Pessoalmente, gosto da ideia de descender não de conquistadores brutais, mas de um povo insignificante que quase nunca se metia nos assuntos de outros povos. Muitas religiões louvam o valor da humildade — mas imaginam ser a coisa mais importante do universo. Misturam chamados para uma humildade pessoal com uma flagrante arrogância coletiva. Humanos de todos os credos fariam bem em levar esse valor mais a sério.```

```Sempre que falam de deus, humanos professam uma abjeta humildade, mas depois usam o nome de deus para serem prepotentes com outros seres humanos.```

_Yuval Harari no Livro 21 Lições Para o Século 21_

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